sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Resiliência, a ordem do dia


                  RESILIÊNCIA, A ORDEM DO DIA

Estamos vivendo tempos difíceis. Em todos os cantos do planeta nos rondam desafios vindos ou dos homens e de seus conflitos em vários níveis, ou da própria natureza revoltada. Situações arriscadas, perigosas, nos tiram rapidamente de zonas de conforto, ocasionando mudanças bastante sérias em nossas vidas. E se não há como fugir do que sentimos diante de tais ameaças constantes e surpreendentes, vamos combinar que resistir a tais choques e tomar decisões urgentes em momentos assim não é coisa para amadores.   

Dizem os sábios que resiliência é a capacidade de voltar ao nosso estado normal. E eu pergunto: o que a palavra normal significa nos dias de hoje?  Qual é o ponto de equilíbrio entre as tensões que se repetem, imprevisíveis e que nos obrigam a estarmos alertas o tempo todo, e um mínimo de relaxamento? Então, para fins de reflexão, digamos que a resiliência envolve um tipo especial de administração, na área do domínio das emoções. Respirações, meditações, reflexões e conversas com amigos, exercícios físicos e psíquicos, música, estudos, entrada em grupos online ou não, leituras, ressignificações de valores e crenças, técnicas alternativas e energéticas presenciais ou à distância as mais diversas, e outras, cujas metas envolvem o encontro da coragem para prosseguirmos em direção à tal normalidade.

 Lembro-me de livros e depoimentos onde seus autores nos contam que suas superações, em diferentes situações, se deram quando o medo foi transmutado em coragem, simplesmente porque a única alternativa existente era essa. Se a coragem costuma aparecer na hora do enfrentamento, tudo indica que de nada adianta negarmos o medo. Ele é inevitável, e devemos deixar que nos ensine sobre o fortalecimento que necessitamos, nos tornando hábeis em transformações de nossos pontos fracos. Não é uma tarefa simples, mas é assim que se mobilizam os recursos para os próximos desafios, abrindo a porta para uma espécie de segundo fôlego. Um, dois, três e já...vida que segue!

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

SOBRE CORAGEM

                         SOBRE CORAGEM


 


Era um final de tarde quando a sirene tocou me lembrando estarmos em guerra em Israel, e nem tinha precisado de tanto controle do celular para poder ouvi-la se tocasse. A surpresa me pegou e não sei descrever o que senti. Apenas me dirigi para a porta, ligada no piloto automático, sem lembrar do celular, e segui os vizinhos em direção ao refúgio logo acima de minha casa. Não sei dizer se foi o medo ou as sequelas de ex-fumante, talvez ambos, mas cheguei ali sem fôlego, me sentindo mal, a ponto de cair. Mas, consegui me aguentar, sentei-me numa das cadeiras, com muitas outras pessoas, esperei os dez minutos necessários, e voltei para casa. Levei uns três dias para me reequilibrar. “Marinheira de primeira viagem”, falei com amigos, pedi ajuda à espiritualidade, perdi a fome, a esperança, e me senti dominada pelo medo. Lentamente fui me acalmando, observando que as pessoas prosseguiam com suas vidas, e libertei-me do stress agudo. Da segunda vez, estava relaxada, o alarme tocou e levei um susto daqueles, mas consegui pegar o celular, calçar os sapatos e abrir a porta, enfrentando o sol escaldante. Dominei o fôlego respirando fundo até que um vizinho me deu a mão e foi me levando até lá em cima onde outros já estavam refugiados. Dias depois fiz esse mesmo percurso, mais esperta, levando minha bolsinha com uma garrafinha de água (que agora dorme próxima à porta), celular no bolso. Não dá para se acostumar com esse tipo de coisa sem pagar o preço, e no meu caso, o estômago ficou revirado por dias seguidos com o medo fazendo das suas.  Na gangorra das emoções ele fica lá embaixo, prendendo a coragem que não consegue descer e se equilibrar.  

Nem sempre temos consciência imediatamente das mudanças que acontecem conosco quando além de sabermos, vivenciamos algo. Decisões urgentes vão nos transformando, e ao nosso jeito de ser e estar nessa vida, empurrando as dúvidas para dar espaço às novas informações apressadas que estão chegando. E, na busca de sentido, de significado, nós vamos interpretando, conectando, tirando conclusões sobre as nossas novelas e novelos, enfrentando as provas com coragem.  Prosseguimos, seguimos adiante, valorizando aquilo que realmente é importante para cada um de nós, retirando o véu que encobre a força que vem dos enfrentamentos. 

Através do medo, eu trouxe um guerreiro para minha consciência, e a coragem vem aprendendo a descer da gangorra. Finalizo lembrando Viktor Frankl: “Não é o que você espera da vida, mas o que a vida espera de você”.  

sábado, 7 de setembro de 2024

LÁ NA VARANDA...

  

                             LÁ NA VARANDA...



Depois de examinar o local como quem vai alugar apartamento, um passarinho construiu seu ninho numa viga perto do teto da minha varanda. Ia trazendo folhas e galhos, instalou-se, e não foi difícil perceber que se tratava de uma futura mamãe, pois um de seus ovinhos caiu no chão da varanda. E assim, todas as manhãs, vê-la chocando passou a fazer parte de minhas meditações. Reparei que de vez em quando ela desaparecia e depois regressava ao ninho e lá ficava. Quem sabe, entediada, queria mudar de ares, piar um pouco com companheiros, voar pelas árvores? Eu acompanhava o processo, e pensava com meus botões sobre a maternagem, sorrindo com as minhas próprias lembranças.
Uns dias depois, vi duas novas carinhas de passarinhos lá em cima. Um dos filhotes deixou o ninho rapidamente, bateu suas asas e voou. O outro ficou tentando voar, batia as asinhas, e desistia, voltando para o ninho. Sua mãe vinha de vez em quando olhar como iam as coisas, dava a ele comida bico a bico e ia embora. Respeitava o seu tempo, e sem saber ela estava me ensinando a fazer o mesmo: cuidar amorosamente, mas sem apegos paralisantes, choros e expressões de abandono ou de rejeição. Assim, a dedicação ao filhote não impediu a natureza de fazer seu papel. Um dia, como era de se esperar, o segundo passarinho também abriu suas asas e voou. Pelas leis do reino das aves a missão estava cumprida, e o ninho ficou vazio. Mas, não por muito tempo, porque novos pássaros vieram, e acostumei-me a vê-lo ocupado desde então.
Muitas vezes damos pouca atenção às mensagens da natureza, deixando passar lições importantes sobre a vida naquilo que nos cerca. Ali, da minha varanda, fui conectada ao tema do ninho vazio, àquilo que nos remete à passagem do tempo, quando trabalhos se encerram, filhos crescem e vão em busca de seus próprios espaços. E o envelhecimento simplesmente acontece, refletindo em nossos espelhos as inúmeras transformações. Convida-nos também a dar uma revoada, buscando folhas para nosso ninho, significados para a nova fase que se inicia. Ao abrirmos nossas asas, lá de cima visualizamos caminhos percorridos, algumas despedidas, superações, é verdade. Mas também enxergamos possibilidades de crescimento, evolução. É a mágica da vida que segue, felizmente sempre trazendo mudanças. Saudades inevitáveis à parte, agora, em nossos voos, as boas lembranças nos acompanham, iluminam os rumos, para nos sentirmos como pássaros retornando aos ninhos, acalentando novos sonhos.


HEBRENGLISH, QUE LÍNGUA É ESSA?

 HEBRENGLISH, QUE LÍNGUA É ESSA?


Alguns imigrantes chegam a Israel "arranhando" o hebraico, outros fluentes, e há os que ainda vão começar o estudo, que buscam cursos, alternativas, professores. No meu caso, uma imigrante "ioiô", aquela que já veio, voltou ao Brasil, e retornou mais de uma vez, com o hebraico bem básico de colégio judaico no Rio de Janeiro, e mais o assimilado nos períodos em que aqui estive, entendo ser fundamental integrar esse idioma, parte da cultura, para se viver aqui. Mas, entre várias tentativas de cursos que se mostraram entediantes, percebo que o domínio de um idioma vai muito além do desejo e da motivação para falar com as pessoas. Há momentos em que a sensação de querer se expressar e não saírem as palavras, simplesmente porque não as conheço, é muito frustrante e me faz sentir como um peixe fora d'água deve se sentir, se debatendo em vão. 

Como cresci ouvindo a mistura de português com idish, arte que minha família dominava, principalmente quando não queriam que as crianças compreendessem as conversas de adultos, passei a usar o mesmo método, desta vez com o inglês. Esse jogo, além de divertido, está me ensinando a supor, até entender do que se trata a conversa. E se antes conversas se limitavam a uns cinquenta por cento compreendidos, e os outros cinquenta por cento por conta da imaginação, agora para poder falar, utilizo o hebrenglish. Outra vida! É uma solução provisória, porque o importante é se relacionar e se fazer entender. Eu rio, e me movimento falando ora em hebraico, e complementando em inglês, às vezes até com mímicas, já que a aprendizagem pode levar tempo, pelo menos no meu caso. Essa mistura pede por um tipo de atenção interessante para dar conta da mudança veloz de idiomas, mas se as pessoas com quem falamos entrarem no jogo, dá certo. Atender telefonemas já é um pouco mais complicado, já que requer certa intimidade. Assim como entender o noticiário, porque não temos acesso à fonte das informações, a TV ou a Internet, para pedir que falem mais devagar. Paciência, isso faz parte do treino. 

Agora, como a vivência de analfabetismo me incomoda demais, prossigo estudando, fazendo exercícios, vencendo lentamente as resistências à concentração necessária. Também tenho trabalhado com meu nível de exigência, e sem resmungar (muito), vou aceitando que é preciso um bocado de energia para mergulhar em verbos, e gramática, a essa altura do campeonato. Enquanto esse processo vai evoluindo, nada de errado em respeitar os próprios limites e deixar que o "hebrenglish" flua, porque como já dizia Chacrinha, o Velho Guerreiro, quem não se comunica, se trumbica.